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sexta-feira, 31 de março de 2017

Capítulo 6

Incrivelmente, não sonhei com o futuro encontro, mas as emoções compensaram durante o dia inteiro.
Passamos o dia conversando, ou melhor, reclamando por ainda ser quarta-feira, por ter que esperar mais um dia para nos vermos.
Maldito retorno. Como eu queria eliminar aquelas aulas que teria à tarde.

O dia se arrastou, ainda mais que eu havia contado apenas para a Laura o que tinha acontecido.
Como não éramos da mesma sala, acabei tendo que guardar isso o dia inteiro, mesmo estando louca para sair gritando para o mundo o quanto eu estava ansiosa.
Descobri apenas que o Artur havia mandado a alguns dias uma mensagem para minha amiga, perguntando se ela achava que tinha alguma chance de darmos certo, mas, como ela ainda não sabia de nada, apenas ignorou.
Claro que quase pirei quando ela me disse isso, mas já era tarde demais. Típico da Laura ignorar algo que mudaria minha vida.

Escrevi letras de músicas apaixonadas nas últimas folhas do caderno durante as duas primeiras aulas depois do almoço, até que o sinal do intervalo finalmente tocou.

Mas talvez não fosse algo tão bom assim.

Eu estava sentada na cantina principal do CMil com a Laura e a Alice. Era impossível não notar minha agitação. E é claro que a Laura não perderia a oportunidade de zombar de mim.

-Tá conversando o boy, Xulia? Esse sorriso na sua cara condena.

Nesse momento comecei a rezar mentalmente pra Alice não questionar, e pensar que era mesmo apenas uma brincadeira. Mas a vida não é tão fácil assim. E, de tanto ela insistir, falei com quem estava conversando.
Logo pra ela, melhor amiga da Renata.
Enquanto isso, torcia pra que não levasse aquilo pra frente, afinal de contas ninguém sabia de nada...

-Uai, mas peraí, como assim boy? A renatinha disse que eles conversavam todos os dias nas férias, que tá na cara que ele tá afim dela.

Devo ter ficado pálida, ou talvez roxa de raiva.
Mas provavelmente foi um verde-quase-vômito, porque em poucos segundos a Laura já havia arrumado uma forma de me levar até o banheiro com alguma desculpa que não consegui entender.
Quando finalmente voltei minha mente para o mundo real, parecia mesmo que ia vomitar, de tanto que a maluca da minha amiga me sacudia.

-Não precisa falar nada. Não precisa me consolar. Eu vou superar. Eu nem tava criando tanta expectativa assim. No fundo eu sempre soube.

-JÚLIA DE MACEDO - por que as pessoas gritam quando estão com raiva? Credo - PARA DE SER DRAMÁTICA E CAI NA REAL. VOCÊ SÓ PRECISA CONVERSAR COM ELE. COM CERTEZA TEM ALGO ERRADO NISSO. VOCÊ SABE COMO AQUELA GAROTA É EXAGERADA.

Eu faria qualquer coisa pra parar aquele escândalo que estava acontecendo, então apenas peguei o celular e digitei um "preciso falar com você" para o Artur, prometi para a Laura que conversaria com ele antes de tomar qualquer atitude maior e voltei para a aula.

Quando finalmente estava indo embora é que fui ver sua resposta, em desespero querendo saber do que se tratava, mas decidi fingir que estava tudo bem e só conversar sobre aquilo pessoalmente no dia seguinte, dizendo não ser nada grave.

Parte de mim queria acreditar nisso. Meu coração dizia para ignorar aquela maldita frase dita pela Alice, para acreditar que não se passava realmente de um exagero e provocação. Afinal de contas, como alguém - alguém que é seu melhor amigo - poderia te enganar e iludir dessa forma? Era muito surreal. Mas, se a suspeita fosse confirmada, tudo iria por água abaixo, e mais uma vez a minha confiança seria traída.

Mais difícil foi convencer o Artur de que ele não precisava se preocupar. Algo em mim dizia que ele não agiria daquela maneira se fosse culpado, mas eu não podia confiar em um coração apaixonado.

O assunto com ele fluía normalmente, e minha raiva já tinha passado.
Deixaria para me estressar de verdade se a suspeita fosse confirmada, e mais uma vez adormeci na nossa conversa.

*

Nem acreditei quando, ao acordar ainda muito sonolenta, olhei para o celular e vi que finalmente era quinta-feira, o dia que definiria - ou não - o começo - ou o final - da nossa história.

Evitei olhar o celular durante a manhã para não ficar ainda mais ansiosa, mas assim que aquela aula de biologia acabou e li um "olha pela janela, já estou aqui fora te esperando" o meu coração quase saiu pela boca.

Ver ele ali escorado no muro do outro lado da rua me fez criar mil situações futuras, mas eu precisava manter o pé no chão.

Desci correndo as escadas, sem pensar no que faria quando o encontrasse de fato, o que falaria a respeito do que a Alice me dissera e em como terminaria aquele encontro.

Nos cumprimentamos meio sem graça, os dois loucos para que a bomba fosse solta, e foi o que fiz enquanto caminhávamos em direção ao DiamondMall.

-Tá bom. Vou te fazer uma pergunta séria e preciso que você seja sincero.

E ele manteve a seriedade, até eu falar.

-O que você realmente tem com a Renata? Fiquei sabendo que parece que isso tudo que você tem comigo não é único... que ela inclusive acha que você estava super afim dela... realmente fiquei bem confusa.

Antes que eu fechasse a boca ele já estava tendo uma crise de riso, típico do Artur. Mas felizmente ele percebeu que eu não estava achando graça alguma naquilo e começou a se defender.

-Júlia, você só pode estar de brincadeira comigo. Me diga que você não está acreditando nisso mesmo, não faz sentido algum. O que você tá pensando? Que eu me declaro assim para qualquer amiga? É lógico que tudo isso é uma tremenda mentira.

Eu não poderia ceder facilmente.

-Ok, eu também achei a história bem maluca, mas a pessoa que me contou parecia dizer sério. Você fez alguma coisa pra Renata chegar a essa conclusão?

-Eu vou ser sincero, você sabe que eu conversava sim com a Renatinha, mas não chega a um décimo do que nós dois temos. E você deve lembrar - infelizmente eu lembrava - que eu já tentei ficar com ela sim, mas tem uns dois anos e foi mais na brincadeira na época de festas de 15 anos, nunca passou disso.

Ele percebeu que eu ainda não estava convencida, e continuou.

-Júlia, eu não arriscaria nossa amizade assim, acha o que? Que eu to marcando um encontro com ela aqui depois que você for embora pra dizer as mesmas coisas? Além disso, tá na cara que eu gosto é de você, ela mesmo sabe disso. E tem outra, depois do que você me contou, eu tenho me afastado muito dela, não gosto dessas atitudes. Gostaria de conciliar as duas amizades, mas se ela não te trata bem, eu também quero distância.

Nesse momento já estávamos chegando no shopping, e eu não tinha mais o que dizer, eu sabia quando ele estava mentindo, e poderia afirmar que não era o que estava acontecendo no momento.

Estávamos ao lado da escada rolante quando ele me puxou para um abraço. Não sei quanto tempo ficamos assim, mas de repente o abraço se intercalava com longos olhares e sorrisos, e novamente nos abraçávamos. Eu podia sentir sua respiração e seu batimento cardíaco, e imagino que ele também sentia os meus.

Os olhares começaram a ficar mais longos, até que finalmente começamos a nos aproximar ainda mais, até que nossas bocas estivessem coladas e não existisse mais espaço entre nossos rostos, até que, depois de dois anos e meio, eu beijasse o garoto que me conhecia tão bem e que seria capaz de mudar a minha vida dali pra frente.

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